‘Joaquim Evangelista, 38 anos, presidente do Sindicato dos jogadores profissionais de futebol, traçou um retrato sombrio do futebol português...’. É assim que começa uma longa entrevista, conduzida por José Manuel Delgado, e que o jornal ‘A Bola’ publicou no dia 14/11/05.
O entrevistador, benfiquista confesso, pôs-me logo de pé atrás, em relação às perguntas. Quanto às respostas, não tendo eu ideia formada sobre Evangelista, limitei-me a fazer o seguinte juízo – será, que à semelhança do anterior presidente, anda à procura de emprego nalgum clube grande?!
Depois de afastar dúvidas, próprias de uma mente retorcida e doentia, dispus-me a ler a entrevista.
Evangelista não sai mal deste filme de terror em que se transformou (nunca deixou de ser) o futebol português. Com clareza lá vai explicando que o problema se centra na falta de qualidade e coragem dos dirigentes, na promiscuidade (que continua) entre a política e o futebol, na incongruência do ‘edifício Madaíl’, que produz a módica quantia de 1700 futebolistas profissionais, com uma nota informativa interessante: para os tais dirigentes, os salários só se consideram em atraso, quando ultrapassam o prazo de rescisão automática, que como se sabe, é de dois meses!
Bem, o diagnóstico é conhecido e está feito. O problema é que ninguém quer mudar absolutamente nada. A começar pelo Secretário de Estado que vai protelando a necessária intervenção, com medo de perder votos, pois claro! E estamos a falar de um Governo suportado por uma maioria absoluta no Parlamento!!!
Evangelista deu, inclusivamente, o exemplo da Espanha, cujo Governo, na altura própria, não teve dúvidas em intervir, contribuindo assim para o desenvolvimento do futebol profissional no país vizinho, como está à vista de todos!
Portanto, tenho que considerar que o presidente do Sindicato disse coisas importantes, mas se me permitem a imodéstia, faltou-me ali qualquer coisa. E por outro lado disse qualquer coisa a mais.
Por exemplo: continua a achar que a Liga deveria ser reduzida para 12 clubes (na linha aliás do pensamento de Delgado, já várias vezes expresso pelo próprio).
Penso que é um disparate porque não vai ao cerne da questão. Apoiou-se no estudo da ‘Deloitte’, que também já critiquei, e que assenta, como se sabe, em critérios teóricos, meramente economicistas, que não provaram em lado nenhum!
O campeonato escocês, por exemplo, baixou imenso de nível, sendo que os campeões continuam a ser os mesmos – Glasgow Rangers e Celtic. Por outro lado, quaisquer alterações no campeonato que não tenham o suporte de uma prévia regionalização (com criação de regiões autónomas no Continente, se necessário), não vai ter qualquer eficácia. A Espanha, criou primeiro as Regiões e depois, naturalmente, os clubes regionais foram aparecendo, e tornaram-se fortes. Não se fizeram reduções porque seriam contraproducentes.
A atestar o que acabo de afirmar (e venho afirmando, desde há longa data), sirvam de exemplo o Desportivo da Corunha e o Celta de Vigo, que antes da criação das Regiões Autónomas, não tinham grandes possibilidades de singrar na 1ª Liga espanhola, e que hoje em dia são grandes clubes em Espanha e na Europa.
Olhemos também o caso da Madeira, que nunca teve quaisquer hipóteses de manter um clube na primeira divisão, e agora, tem dois clubes na 1ª Liga! Já sei que estão a pensar nos dinheiros e apoios que vão para as ilhas, mas isso é uma falsa questão, como se demonstra no caso da Espanha. Tem a ver com o desenvolvimento das Regiões, inquestionável, outrora subdesenvolvidas, de onde as populações fugiam e emigravam e que hoje, graças ao Estatuto da Autonomia, permitem uma razoável qualidade de vida aos seus habitantes. A Galiza, em Espanha, e a Madeira, em Portugal, são bons exemplos!
A Madeira pode também ilustrar o enorme risco que correríamos se seguíssemos os critérios e a linha economicista da ‘Deloitte’. A tal Liga com 12 clubes, poderia vir a ter dois ou três clubes da Madeira! Eu explico: os clubes da Madeira têm-se classificado, época após época, muito acima dos lugares de descida, não se prevendo que a dita redução os venha a afectar. A selecção far-se-ia, decerto, entre os clubes do Continente, acantonados à volta de Lisboa e Porto, a sofrerem uma concorrência de proximidade cada vez mais forte. O Benfica, o Sporting e o Porto tornar-se-iam cada vez maiores (é o que vem sucedendo), sem qualquer benefício para os chamados clubes ‘médios’. Dá que pensar!
Mas existe ainda outro ponto, que não foi abordado na entrevista, e que me parece muito importante: tem a ver com a mentalidade e a perspectiva com que se organizam as provas em Portugal.
Referindo-me ao futebol profissional, tudo vem sendo estruturado, no sentido dos clubes grandes serem candidatos à conquista de títulos Europeus, em lugar de se valorizar o nosso campeonato! Em Espanha e em Inglaterra, para dar dois exemplos de campeonatos competitivos e rentáveis, a prova mais importante é a respectiva Liga. Por acréscimo e só por acréscimo, vêm as competições europeias. Este é um problema mental, de raiz terceiro-mundista, que também dá que pensar! E que revela a razão de muitas das moléstias do nosso futebol, que me atrevo a resumir no seguinte desabafo – vivemos todos de tanga, para sustentar três fidalgotes que se habituaram a viver bem na Europa! Muitas parecenças com as desigualdades de tratamento (de ordenado) entre a malta que cá tem que viver e trabalhar e os nossos eurocratas que folgam em Bruxelas!
Estas, algumas das lacunas de Evangelista, que no entanto, não ensombram a importância da entrevista.
terça-feira, novembro 15, 2005
Notícias do Sindicato
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